ÁREAS DE INTERESSE: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO.
Passo 1: Confira o enunciado!
O Tribunal de Contas da União - TCU instaurou tomadas de contas em face da EBCT para apurar eventuais ilícitos em negociação realizada há 12 anos. Na ocasião, a empresa pública assinou confissão de dívida pela qual se obrigava ao pagamento à outra empresa por vários anos. O TCU, em sede de cautelar, determinou a suspensão dos pagamentos. Em face desse quadro, pesquise e responda:
a) Qual a medida judicial poderia ser manejada pela empresa para retomada dos pagamentos? Onde ela seria promovida?
b) É aplicável à espécie o disposto no art. 54 da Lei de n. 9.784/1999?
c) Em que consiste o procedimento de tomada de contas e qual a sua lei de regência?
d) o procedimento de tomada de contas especial é condição para inscrição no CAUC?
Passo 2: Confira o espelho elaborado pelo professor Jean e assista o vídeo comentado no IGTV do Themas.
a) Qual a medida judicial poderia ser manejada pela empresa para retomada dos pagamentos? Onde ela seria promovida?
Há, no presente caso, pelo menos duas medidas judiciais à disposição da empresa interessada com a finalidade de sustar a suspensão dos pagamentos cautelarmente determinada pelo TCU. No caso narrado é perfeitamente possível o manejo de ação ordinária (principal ou mesmo cautelar) para o pleito de tutela provisória para afastar a suspensão. Se essa for a via eleita, impõe a previsão do art. 109 da CF, o que atrai a competência da Justiça Federal de primeiro grau.
É possível também a impetração da ação de mandado de segurança pela empresa pública federal. Em se optando por essa via, porém, a competência será atraída pelo STF, por força do que dispõe o art. 102, I, d, da CF.
b) É aplicável à espécie o disposto no art. 54 da Lei de n. 9.784/1999?
Inicialmente, importa registrar que o art. 54 da Lei de nº 9.784/1999 estabelece o prazo decadencial quinquenal para que a Administração Pública federal anule seus próprios atos. Trata-se de lei federal, que regular o processo administrativo apenas no âmbito federal. Há um importante aspecto no próprio art. 54 que ajuda na elucidação da questão. Ele excepciona do prazo as hipóteses em que o agente agiu de má-fé, a indicar que mesmo ultrapassado o prazo quinquenal ainda será possível à Administração Pública extinguir o ato, se o agente tiver agido com má-fé.
Esse foi um dos fundamentos utilizados pelo STF não solução da controvérsia. Para o Pretório Excelso não se aplica o prazo da aludida lei pelo fato de que há lei especial de regência da matéria, a Lei de nº 8.443/1992, que não estabeleceu esse limite temporal. Assim, ainda que se aplicasse a lei de processo administrativo, a incidência do prazo dependeria da verificação quanto à existência de má-fé, o que somente seria possível após a conclusão do procedimento de tomada de constas especial.
Alie-se a esse um outro fundamento decorrente do fato de que para o STF os casos de violação direta à CF não comportam a incidência de prazo prescricional.
O STF possui importante precedente acerca da prescrição das ações de ressarcimento promovidas pelo Poder Público. Trata-se do RE 852.475, no qual restou fixada a tese de o ressarcimento ao erário decorrente da prática de ato de improbidade administrativa doloso é imprescritível. Trata-se de exceção à regra, anteriormente fixada pelo próprio STF, no RE 669.069.
Mais recentemente, em tema importante, o STF fixou a tese de que é prescritível a ação de ressarcimento fundada em pretensão do TCU (Tema 899, RE 636.886).
c) Em que consiste o procedimento de tomada de contas e qual a sua lei de regência?
O procedimento de tomada de conta especial é um processo administrativo conduzido, em âmbito federal, pelo Tribunal de Contas da União com a finalidade obtenção do ressarcimento do erário em decorrência de desvios e demais formas de aplicação ilícita de recursos públicos. Esse procedimento deve ser utilizado quando esgotadas as formas locais de ressarcimento do erário. Segundo o sítio eletrônico do próprio TCU:
A tomada de contas especial é um processo administrativo devidamente formalizado, com rito próprio, para apurar responsabilidade por ocorrência de dano à administração pública federal a fim de obter o respectivo ressarcimento. Essa dinâmica tem por base a apuração de fatos, a quantificação do dano, a identificação dos responsáveis, nos termos do art. 2º da IN TCU 71/2012.
Esse procedimento é regulado pela de nº Lei 8.443/1992 e objetiva apuração das seguintes irregularidades:
d) O procedimento de tomada de contas especial é condição para inscrição no CAUC?
O Cadastro Único de Convênio, atualmente Serviço Auxiliar de Informações para Transferências Voluntárias (CAUC), é o sistema que registra o regular cumprimento das obrigações fixadas em instrumentos de convênios e similares que asseguram transferências voluntárias efetuadas pela UNIÃO. Atualmente, esse sistema é regulado pela IN nº 2/2012. Na prática, esse cadastro funciona como um registro negativo, que impede o órgão ou entidade nele inscrito de obter recursos por via de novos convênios e similares enquanto não solucionadas as pendências nele apontadas.
Pela gravidade que essa inscrição significa, o STF tem entendimento de que a inscrição deve ser precedida de procedimento administrativo no qual sejam assegurados o contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV da CF) e, se instaurado procedimento de tomada de contas especial, que ela seja primeiro concluído, para que só então se proceda à inscrição negativa.
Segue o importante precedente:
A jurisprudência desta Corte tem reconhecido, com base no postulado do devido processo legal, a necessidade de instauração de prévio processo de tomada de contas especial como requisito para inclusão em cadastro de inadimplência. É certo que o art. 25, da LRF, exige, para efeito de transferência voluntária, a comprovação de que o beneficiário se acha em dia quanto (…) à prestação de contas de recursos anteriormente dele [ente repassador] recebidos. Todavia, o postulado do devido processo legal exige que essa comprovação se dê por meio de procedimento que assegure o contraditório e a ampla defesa. No caso destes autos, não há notícia da conclusão de Tomadas de Contas Especial, com apuração dos danos ao erário federal e das respectivas responsabilidades. Trocas de ofício entre os convenentes não servem de comprovação da garantia da ampla defesa e do contraditório; ao contrário, demonstram a fragilidade dessa espécie de procedimento para a obtenção do ressarcimento ao erário e, sobretudo, para apuração de responsabilidades. Trata-se de procedimento unilateral, decidido pelo ente repassador de recursos, sem indicação de garantias processuais, porque de processo não se trata.
Antes, portanto, da instauração da Tomada de Contas Especial não há validade na inscrição do ente federado em cadastros restritivos, por ausência do devido processo legal a tanto exigido. Ressalte-se, por fim, que o registro da inadimplência no sistema de gestão do instrumento determinado pela Lei nº 10.522/02 não autoriza, por si, a aplicação de restrições ao ente federado tido por inadimplente. A inscrição que implica limitação a direitos, para ser efetivada, há de ser sempre acompanhada do devido processo legal. Desta feita, porque não ultimado o procedimento de Tomada de Contas Especial, tenho – nos termos da recente jurisprudência desta Corte – que é ilegítima a inscrição dos autores nos cadastros de inadimplência federal. (STF, ACO 2962 AgR/DF, rel. Min, Dias Toffoli, julgamento em 20.06.2017)